QUEM SÃO OS SEUS HERÓIS?

Por Leandro Bertoldo Silva

Ponte entre tempos…
Mundos que se completam…
Quem sou eu agora?

É comum termos personagens que marcam ou marcaram nossas vidas. Quem nunca se imaginou sobrevoar os arranha-céus das cidades como o Super-Homem, ou subir pelas paredes como o Homem-Aranha e até combater o crime ao usar um laço mágico como a Mulher-Maravilha? Eu também tenho os meus personagens, mas nenhum, por mais poderes existentes, me falou tão profundamente quanto um específico, e olha só: nem poder ele possui, a não ser sua inteligência… Engana-se quem pensou em Batman! O meu herói, sim, pois acabou por se transformar em um herói para mim, não era bravo, valente, nunca salvou ninguém de perigos, a não ser a mim, salvo do não saber das coisas, do não gostar de ler, de não conhecer histórias e mitologias, filosofias e inventores. O meu personagem é, e sempre foi um sábio sabugo de milho feito pelas mãos talentosas e generosas de Tia Nastácia, colhido em um milharal no Sítio do Picapau Amarelo: Visconde de Sabugosa.

Desde criança, Visconde povoa meu coração de sonhos e viagens inesquecíveis. Quantas vezes fui à lua em um foguete, ajudei Teseu a vencer o Minotauro e quase morri de susto ao ficar a poucos centímetros da boca do Boitatá! Sim, vivia as aventuras do Sítio como se fossem minhas e, embora admirado com a coragem de Pedrinho e sua música que me fazia chorar, como faz até hoje — ela, inclusive, foi o toque do meu celular por muito tempo —, diferente da maioria dos meninos da minha idade, era o Visconde que eu queria ser. Na minha imaginação, passava horas na biblioteca e os meus poucos livros reais se transformavam nas enciclopédias e compêndios lidos e estudados pelo sábio sabugo. Os pregadores de roupa da minha mãe se transformavam em máquinas e equipamentos moderníssimos capazes de nos transportar pelo tempo. Tampinhas de garrafa, alfinetes, papéis laminados de bombom, potes de vidro, tudo eu levava para o meu quarto, ou melhor, para o meu laboratório, e ficava lá inventando coisas. Afinal, eu era o Visconde!

Esse personagem vai além de um gosto de criança, de uma simpatia infantil que depois que a gente cresce desaparece. Visconde permanece em mim como uma entidade real, lúcida. Em todos os momentos da minha vida ele esteve presente, e sempre da melhor forma, silencioso, introspectivo, cúmplice… Poucas pessoas sabem disso (até agora). Até na minha história do pé de ameixa contada aos quatro cantos, Visconde estava lá. Era nele que eu me transformava ao subir na árvore e fazer de seus galhos as estantes dos meus livros. Hoje tenho uma filha já moça, e é uma das poucas a saber da minha “identidade secreta”… Ela faz os meus sonhos permanecerem acordados. Sou muito grato, pois, apesar dos tempos modernos, ela permitiu que eu a apresentasse ao meu mundo, às minhas aventuras e, além de conhecê-las, entrou nelas, compactuou com meus personagens, estendeu-lhes a mão e acolheu-os em seu coração. Não tenho dúvidas! Yasmin é uma daquelas princesas contadas pela Dona Benta e fazia com que eu, Visconde, pesquisasse a respeito nos livros de história. Mas me faltava uma coisa: faltava, além de ser o Visconde por dentro, ser também o Visconde por fora, deixá-lo se mostrar em mim assim como eu sempre me mostrei nele. E mais uma vez, foi ela, minha filha, a responsável por isso. Em seu aniversário de 11 anos onde todos podiam se fantasiar de alguma coisa, resolvi fazer o contrário; quando todos colocaram suas máscaras, resolvi tirar a minha…

O difícil foi, depois da festa, voltar à fantasia da vida. Mas qualquer dia eu volto à realidade. Obrigado, Visconde, por termos sido um só. Vamos às nossas aventuras. Elas ainda não acabaram.

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E então, gostou dessa história? Sempre que volto a ela consigo ter a sensação gostosa de ser quem sou… Agradeço por sua leitura e fico já na curiosidade de saber quem são os seus heróis… Por acaso, a história te remeteu a eles? Diga pra mim e aproveite para curtir, comentar e compartilhar com seus amigos. Você já sabe: isso é um bálsamo para um escritor.

Até a próxima.

REENCONTRO EXISTENCIAL

Por Elisa Augusta de Andrade Farina
Presidente da Academia de Letras de Teófilo Otoni
e integrante da turma Lygia Fagundes Telles
do curso Vivenciando a Linguagem, Leitura
e Escrita, da Árvore das Letras.

Não possuo uma vida ideal, pois para mim que a conceituo como a possibilidade em que se consegue uma paz interior, vivendo a maior parte do tempo com serenidade, entra em distonia com minha realidade existencial.

Para se conquistar uma vida tranquila e equilibrada é essencial que você saiba como alcançar seus objetivos. O real nunca aparece. E quando aparece, está maquiado, colorido artificialmente por filtros ideais. O grande mal é quando se exercita o ideal, nega-se a vida. Temos que fazer escolhas, mesmo que essas não tenham um resultado satisfatório. O que não pode é deixar que os sonhos sejam petrificados por convicções que não sejam nossas.

Quando idealizamos, habitamos a dimensão do futuro e não enxergamos o mundo real que nos circunda. Acabamos dessa maneira por ficar sem nada porque não há outra realidade além do que é vivida aqui e agora.

Na minha visão não existe vida ideal. É quimera. O que me impulsiona a buscá-la é a liberdade de ser eu mesma e fazer uma desconstrução de tudo que representa minha vida que não me satisfaz como deveria. É ter a coragem de ignorar tudo que é imputável e ter a consciência de que minha felicidade dependerá da extensão da minha frustração ou êxito da minha busca vital.

Desta forma para não me perder, eu brinco de ser feliz e vou de tempos em tempos me reinventando, sorrindo para exterminar a tristeza que teima em reinar e me tornar uma outra pessoa que não me representa.

Quero deixar o fluxo da vida fluir. Não posso resistir. Quero ser eu mesma com a intensidade que a vida se apresenta a cada  amanhecer. Já fui água, seiva, vegetal. Sou agora gota trêmula, raiz exposta!

Quero ser água fluída e cristalina sem limites, com a certeza a me guiar ao caudaloso curso do rio da vida.

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E então, o que achou desse pequeno e profundo texto? Em momentos de perplexidades, em que as dicotomias da vida se afloram de formas tão violentas inexplicavelmente, o que é ter uma vida ideal? Aliás, para você existe uma vida ideal? Muito obrigado por sua leitura e te desejo boas reflexões.

Forte abraço!

O VELHO QUE CONSERTAVA COISAS

Por Leandro Bertoldo Silva – do livro Entrelinhas contos mínimos.

Enquanto não atravessarmos

a dor de nossa própria solidão,

continuaremos a nos buscar

em outras metades.

– Fernando Pessoa –

Gosto muito dos velhos que consertam coisas. Eu mesmo tive um tio assim. Consertava tudo.

Uma vez pegou uma lâmpada incandescente queimada no lixo, emendou seu filamento e o pequeno bulbo de luz nunca mais deixou de acender.

Osmânio era um velho como ele: consertava ferros, rádios, relógios de corda, chuveiros, televisões velhas… Mas o que ele sabia mais consertar eram sentimentos…

Não havia um só casal que, se estivesse a ponto de separação, Osmânio não os unia. O que falar das brigas entre irmãos, pais, mães? Até os animais pareciam respeitar o dom reparador que vinha das mãos daquele velho, e a braveza instintiva se transformava em mansidão quando estavam em sua presença.

Os alaridos viravam sons de passarinhos, assim como as flores floresciam mais e os aromas ficavam ainda mais cheirosos. Osmânio era assim: consertava corações…

Mas, apesar de tanto talento naquelas mãos, a tristeza não se apartava de seus olhos. Camuflava-se nos sorrisos tímidos daquele jeito misturado de sentimentos. E isso por uma simples razão: Osmânio era homem e, como tal, havia amado, e muito, uma mulher que agora existia apenas em seu passado. Ninguém nunca soube quem era de fato ou o que acontecera para ela não ter envelhecido com ele.

O que todos sabiam, porém, era que Osmânio, o velho que consertava corações, nunca havia consertado o seu…

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Olá você que está aqui! Muito obrigado por sua leitura. Essa é uma história muito curta, mas vasta de reflexão, não é mesmo? Por isso, além de pedir, como sempre, a gentileza do seu compartilhamento e comentário, deixo uma pergunta: o que você precisa consertar em seu coração?

Não se apresse em responder…

Forte abraço e ótimas reflexões.

ESSE ANO EU QUERO O SIMPLES SEM EXCESSOS

Por Leandro Bertoldo Silva

Todo final de ano somos acometidos pelo desejo do novo. É um desejo que nos leva a fazer listas de ações —na maior parte das vezes não cumpridas — e uma infinidade de rituais na esperança de dias melhores.

Há, também, certa quantidade de gurus com suas previsões, leituras astrais, queimas de karmas e até mesmo recomendações de se usar determinadas cores de roupa, comer ou evitar essa ou aquela iguaria e outras coisas mais na intenção da boa sorte. Não sou contra nada disso. Desde que se sinta bem, vá em frente. O importante é ser feliz. Mas deixe-me dizer uma coisa…

Esse ano eu quero o simples sem excessos, só isso. Em muitas coisas, quase todas, eu desejo o menos: menos barulho, menos discurso, menos necessidade de mostrar para que os olhos possam enxergar. Quero aprender com o menino do Manoel, que falava que “os vazios são maiores e até infinitos” e me formar em desenchimentos.

Sou do tipo de pessoa apaixonada pelo pequeno, pelo pouco, pelas miudezas das coisas, e isso não quer dizer pobreza material e muito menos de espírito ou falta de crença em conquistas, muito antes pelo contrário. Coragem e uma boa dose de sensibilidade se fazem necessárias para enxergar o quanto é belo o nascer do sol, o cair de uma folha, o canto de um pássaro, o reconhecimento afetivo de um animal. Junte-se a isso o sorriso de uma criança e o afago de um idoso e o mundo desabrocha tal qual pétala de rosas.  Ainda bem não ser possível colocar tudo isso em um quadro, porque nenhuma dessas coisas nasceram para serem emolduradas. É necessário saber apreciá-las em sua liberdade. E é por isso que são preciosas e raras porque poucos sabem o gigantismo de cada uma delas.

Que possamos esvaziar-nos de ilusões, ser água para correr livremente e enxergar o aconchego do silêncio; ele até pode ser quieto, mas nos diz o certo.

Que encontremos, pois, em nossos corações, o silêncio das necessárias verdades, e que o simples nos leve às nossas letras.

Queridos amigos e amigas, desejo a todos vocês um ano de magnífica beleza. Sejamos poetas das cores, dos sabores, dos amores, dos encontros sem preconceitos. Que saibamos extrair a preciosidade da vida em seus menores detalhes. São neles que moram as essências.

Feliz 2023 e até os próximos dias em que estaremos juntos na continuidade da nossa caminhada e de nossas virtudes.

Forte abraço!

STORYTELLING

Você já passou pela experiência de desejar algo ardentemente e, de repente, perceber que já a possuía há tempos e não se dava conta disso? Pois é, isso aconteceu comigo… Eu sou fruto de uma árvore!

Sempre admirei as pessoas cuja forma de vida se assemelha intimamente com aquilo que acreditam. Quantas pessoas você conhece que vivem uma vida que não querem? Eu sempre quis ser escritor sem saber ao menos o que isso, de fato, significava. E é exatamente aqui que a minha vida se funde com um pé de ameixa…

Eu tinha 7 anos quando a minha brincadeira preferida era subir em um pé de ameixa que ficava na casa da minha avó, e lá ficar horas viajando pelas páginas dos livros que levava comigo, usando os  galhos da árvore como estantes. Eu não tinha uma ideia muito clara do que aquilo representava, mas eu também queria inventar histórias. Foi assim que se deu o meu contato com a literatura.

Para mim livros é a minha razão de vida. Os primeiros que li foram os clássicos “Cinderela” e “O Caso da Borboleta Atíria”, da antiga coleção Vaga-Lume. Lia-os de cima do pé de ameixa sempre na companhia de outros livros que, com o passar dos anos, foram ficando mais “robustos”. A partir de José Lins do Rego fui descobrindo uma infinidade de outros escritores e escritoras, e entre as muitas coisas que me ensinaram, está o fato de eu querer profundamente estar entre eles, fazendo parte do mundo das histórias, dos poemas, dos romances, dos contos, das crônicas, pois aquilo tudo me encantava. 

Embora o pé de ameixa já não exista mais, o que mais me deixa feliz é que anos depois, já formado, casado e pai, recriei o mesmo pé e dei a ele o nome de Árvore das Letras, que hoje é a minha editora sustentável, por onde confecciono e adivinhe! Publico livros…

Devo dizer que nada disso teria acontecido se não fossem muitas pessoas que entenderam o meu amor pelos livros e pelo pé de ameixa. Essa árvore me acolheu como um fruto, cuidou de mim e dos meus sonhos, afagou a minha imaginação e moldou a minha existência com livros de tal maneira que digo sem hesitação que eu sou essa árvore e essa árvore sou eu.

Essa é um pouco da minha história. Todos nós temos uma . Qual é a sua?

Forte abraço!

VERACIDADE X LUCIDEZ

Por Valéria Gurgel

A foto era nostálgica por demais para pensar sequer na possibilidade da notícia ser falsa! Porém, além daquela imagem, estava escrito ali, bem na primeira página do jornal A GAZETA LOCAL com letras graúdas:

NAMORADO FALECIDO ENVIA SUA BIKE DE PRESENTE PARA SUA NAMORADA.

Sim, diante da prova explícita estacionada bem embaixo da janela, local onde os primeiros suspiros apaixonados e lábios sussurrados de desejos cálidos se deram, impossível duvidar. Uma imagem fala mais que mil palavras! Era um fato. Diante um fato comprovado, não há nada a declarar, nem contestar. Será?

Não demorou e começou aquele zum… zum… zum e a notícia se espalhou de boca em boca pela vizinhança.

Ninguém tinha o mínimo de encorajamento lógico de bater à porta para perguntar ou de sequer ter a lucidez para refletir, pensar em outra possibilidade menos bizarra. Conferir se era a mesma bicicleta, chamar a polícia, ou passar na rua em frente a casa de Duda.

Assustados, os moradores do bairro inteiro fecharam as janelas de suas casas.

A sinistra notícia logo viralizou e foi parar nas redes sociais. Uma onda nebulosa coberta de interrogações correu mundo em fração de segundos. Não se falava de outra coisa e a foto com a matéria sendo compartilhada ininterruptamente.

Todos sabiam da paixão de José Antônio, o falecido, por aquela bicicleta antiga, que passava de geração em geração e que terminou herdada de seu tio. Ela guardava reminiscências de mais de um século. E quem daquela cidade não havia visto ele pedalando pelas ruas estreitas e praças com Duda, de vestido rodado, flor no cabelo, sentada de lado na sua garupa?

Verdade?

Mentira?

Fato!

Fake?

Verdade!

Mentira?

Fato?

Fake!

Povo dividido. Discussões, insultos, escárnios, controvérsias, apostas, chacotas, vizinhos, famílias inteiras se tornaram inimigas por uma bobagem daquela.

A casa de Duda permanecia fechada. A bicicleta estacionada a frente de sua janela.

Quinze dias depois, a jovem apareceu. Havia viajado para a casa dos avós para espairecer os ais.

A famosa bicicleta, motivo de tantos assuntos controversos já não se encontrava mais ali. E a jovem só não conseguia entender como um simples fato pôde tomar aquela proporção nacional, internacional.

A explicação era simples.

O irmão do falecido José Antônio emprestou a bicicleta para o primo dele, que necessitava um veículo para chegar até a casa de Duda e por ali se instalar. Havia sido contratado por ela para ficar na casa enquanto se ausentou, cuidando do seu imóvel, de seus gatos e de seu jardim.

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Gostou do texto? Delicioso, não é? Pois veja agora o mesmo texto sendo falado com o recurso da música no vídeo abaixo.

Este trabalho nasceu de uma dinamização do curso Vivenciando a Linguagem, Leitura e Escrita, na Árvore das Letras, no qual a Valéria Gurgel é uma das integrantes da turma Lygia Fagundes Telles.

A propósito, siga a Valéria em seu espaço no Recanto das Letras clicando AQUI! Vale muito a pena…

Forte abraço!

Até a próxima.

O COLORIR DE UMA FLOR

Por Leandro Bertoldo Silva

Levantou cedo. Enquanto a água fervia para o café, se arrumou e verificou se estava tudo certo com o material da escola. Era o seu primeiro dia de aula e não tinha a menor ideia do que encontraria, principalmente após a recomendação da diretora dias antes: “Não vá puxar muito dos alunos, professor. Eles não estão acostumados. Além do mais, estamos no interior…”.

O fato de ter vindo da capital nunca fora para Isidoro preceito de ser diferente. E daí estar no interior? Muito estranho. Mas lá foi Isidoro com uma diferença, sim, ao menos estrutural. Ele não tinha uma pasta ou bolsa, como os outros professores; ao contrário, ele tinha uma mala repleta de livros e carregava às costas um violão. E foi assim que adentrou pela primeira vez aquele portão escuro como o novo professor de Português.

Embora e escola estivesse toda pintada e com panos esticados em formato de grandes triângulos em tons diferentes, a falta de cor era evidente, não uma cor física, mas uma cor de alma, de falta de sorrisos reforçada pelo cinza do piso o qual gritava aos seus olhos. Sempre pensou: “As escolas nunca deveriam ser cinza, nem mesmo onde pisamos.” No entanto, estava ele ali em meio a uma a esperar pacientemente o seu momento de conhecer os alunos.

Feitas as apresentações, os alunos foram para as suas salas desanimados e desbotados, enquanto os professores, em desmaio de cores a reclamarem do fim das férias, foram pegar os seus pincéis. Isidoro não precisava deles, a não ser para pintar o chão, onde um rolo seria mais adequado.

Nem pinceis e nem rolo. Adivinhou-se na entrada de cada turma o que Isidoro trazia de novidade. No lugar do “bom-dia, vamos sentar nos seus lugares”, o novato professor sentava-se em cima das carteiras junto aos alunos, ou no chão os convidando a fazerem o mesmo, sacando o violão e contando-lhes histórias.

Os dias foram passando e o professor seguiu a sua tentativa de colorir a escola. Entendia agora o porquê em tempos meninos, ainda no jardim da infância, quando seus pais perguntavam o que ele havia feito, ele respondia: “Eu só coloro”. Essa sempre foi a sua missão, ainda mais do que ensinar as próprias letras.

Porém, o empreendimento era árduo. Não contava com os outros professores e muitos alunos não compreendiam nem o vermelho, nem o azul ou qualquer outra cor de suas palavras. Sentia-se na superfície, não havia profundidades. Lembrou-se da sentença da diretora ao recomendá-lo cautelas. Estaria ela com a razão?

Isidoro foi para casa. Pensativo. Queria tanto colorir se não a escola, ao menos o coração daquelas crianças e jovens! Em sua biblioteca buscava nos livros a cor perfeita a salvar do desbotamento contagiante aqueles que se acinzentavam.  De repente seus olhos pousaram em um pequeno livro de capa preta, sem atrativos e muito sem graça em meio a tantos outros volumosos. No título lia-se: “O coração escuta pela boca”, de Silvana de Menezes. Tratava-se da biografia romanceada de Freud. Será?… Nunca acreditou em julgar um livro pela capa. Pegou-o e o guardou em sua mala. No dia seguinte o apresentaria para os alunos na berma de um pensamento: “as pessoas são como os livros; algumas serão tocadas, lidas e descobertas enquanto outras permanecerão fechadas”.

Tal pensamento se refletiu na realidade quando, em meio a vários alunos e alunas, Isidoro viu brilhar um amarelo diferente, um ponto de luz nos olhos de uma menina. Nenhum livro havia conseguido tal feito. E fora justamente aquele de capa preta a ganhar variedades de belezas como um caleidoscópio a fazer nascer alguns anos mais tarde uma profissão.

A menina, miúda ainda de idade, cresceu com o passar dos anos, os mesmos anos que fizeram Isidoro não estar mais naquela escola, pois o tempo não havia colorido os seus despropósitos.

Sentado junto à janela a olhar uma flor prestes a abrir em seu jardim, ouve um toque de mensagem em seu telefone:

“Oi, professor, tudo bem? Hoje é o lançamento do meu trabalho, do meu projeto como psicóloga e eu postei um vídeo explicando o motivo de ter escolhido a psicologia. Obviamente você fez parte disso, fez parte lá das raízes até as folhas e as flores dessa árvore linda que eu construí. E não tem como falar desse projeto sem me lembrar de você. Foi por causa do livro que você passou, “O coração escuta pela boca”, que esse amor nasceu em meu coração. Estou te mandando essa mensagem para te agradecer. Essa vitória não é só minha, essa vitória é nossa. Muito obrigada mesmo por ter feito parte disso”.

Ao escutar a mensagem e com os olhos marejados, viu que a flor, em um colorido intenso e cintilante, acabara de se abrir.

*A mensagem descrita acima é real e dedico essa história à Fabiene Lemos, antes uma aluna, hoje uma amiga.

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Obrigado por sua leitura. É ela a incentivadora de toda escrita. Espero ter gostado dessa história inspirada em um fato real. Peço a gentileza de curtir, comentar e compartilhar com seus amigos. Para um escritor não há presente mais valioso.

Até a próxima.

UM BOM COMEÇO PARA INÍCIO DE CONVERSA: UMA SINGELA RELAÇÃO PARA SE CONHECER A LITERATURA BRASILEIRA

Por Leandro Bertoldo Silva

Você consegue definir?

Imagine um mundo formado por pedaços coloridos de vidro, sendo estes refletidos por espelhos, a ocasionar, por meio de sua movimentação, imagens coloridas e diferentes em contínuas transformações…

Certamente, você associou essa descrição a um caleidoscópio, correto?

Correto. Mas não estou falando de um caleidoscópio comum, este do objeto cilíndrico, embora seja cilíndrico o mundo em que vivemos.

O que quero dizer?

Bem, imagine que você tenha olhos de vidros multifacetados, suas opções são inúmeras e o simples fato de saber que você pode mudar a realidade o fascina. Seu espírito é inquietante, corajoso e determinado, um desbravador de sentimentos que tem na palavra sua força de transformação.

Você sente as ideias fervilharem dentro de você. Sabe que o seu trabalho é libertá-las, pois o mundo depende disso e um dia o reconhecerá, mas, mesmo não reconhecendo, você precisa escrever… E cada palavra, cada frase, cada pensamento constrói uma época, um estilo, uma era…

Suas palavras ganham os livros, suas ideias ganham o mundo, às vezes aplaudidas, às vezes contestadas, e as páginas, manuseadas, se transformam num gigantesco caleidoscópio da humanidade…

Sabe do que estou falando?

Simplesmente de uma das artes mais fascinantes da humanidade, exatamente porque, como os pedacinhos de vidro que mudam o tempo todo, vai se formando nas indefinições, nos contrastes, nas inquietações… E são desses estímulos, alimentados por mentes talentosas e um profundo senso crítico e estético de sua época – e são muitas – que ela surgiu desde os primórdios de nossa descoberta: a literatura!

Essa arte magnífica, responsável por pensamentos como de Oswald de Andrade, ao afirmar, que “antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade.”

E isso nos impulsiona a pensar, a refletir… E a devida inserção desses pensamentos vai, como foi, construindo nossa realidade e moldando nossa existência.

Mas deixe-me dizer uma coisa…

Você provavelmente já deve ter lido a seguinte frase atribuída à Bill Gates:

“Meus filhos terão computadores, sim, mas antes terão livros. Sem livros, sem leitura, os nossos filhos serão incapazes de escrever — inclusive a sua própria história.”

Pois bem, uso desse pensamento para dizer que devemos, sim, ler os grandes clássicos e autores estrangeiros, assim como os seus contemporâneos, mas antes precisamos conhecer a nossa própria literatura.

Para mim, não há nada mais lindo e importante no mundo das letras do que a nossa literatura brasileira: Machado de Assis, José de Alencar, Lima Barreto, Fernando Sabino, Manoel de Barros, João Cabral de Melo Neto, Lygia Fagundes Telles, Marina Colasanti, Murilo Rubião, Maria Clara Machado, Jorge Amado e tantos nomes que já foram referências para além-fronteiras.

Foram?!

Sim, foram! Não são mais, pelo menos como outrora.

E talvez por lerem, claro, os grandes clássicos e nunca deixarem de valorizar não apenas a própria língua, mas a própria arte em prosa e verso do seu país, tantos outros autores e autoras surgiram alcançando igualmente lugares de referência.

Sinto que vivemos hoje uma escassez de grandes escritores e escritoras, como vemos surgir em África, por exemplo. Isso muito se deve à mídia ceifadora e interesseira do comércio e à falta de verdadeiro incentivo à nossa literatura.

Mas nada está perdido!

Vemos crescer o movimento da literatura independente em nosso país, construindo caminhos sustentáveis e promissores. No entanto, para que isso possa acontecer com mais propriedade e força, há de voltarmos os olhos para o que nós produzimos.

Por isso, este texto é um guia, ou mesmo um mapa que, como tal, pode e deve ser acrescido de novos caminhos e até atalhos que as mãos e olhos deste que vos escreve porventura não mencionou.

O que eu quero dizer?

Na sequência vai uma relação da nossa história literária em obras e autores que tive o cuidado de traçar certa linha do tempo, desde o Romantismo — por ser a primeira grande ruptura com a Corte em busca de uma literatura genuinamente nossa, com espírito nacionalista — até os nossos dias. Embora bastante incompleta, é um bom começo para quem se aventurar a conhecer a melhor e mais vasta literatura do mundo: sim, a nossa! Para que eu não caia naquela velha máxima do “faça o que eu falo, mas não faça o que eu faço”, devo dizer que sim, eu li todas as obras relacionadas aqui, e muitas delas eu revisitei, como revisito constantemente. É por isso mesmo que elas estão aqui…

Mas aqui vai um pedido, não sem antes de duas ressalvas!

A primeira é que me furtarei da responsabilidade de escrever aqui neste blog o que já se encontra facilmente em centenas de outros sites pela internet, ou seja, as considerações e resumos de cada obra. “Copiar e colar” definitivamente não… Irei simplesmente citá-las, assim como os seus autores, e inseri-las nos seus respectivos momentos históricos numa espécie de linha do tempo.

A segunda ressalva é que trago tão somente as obras lidas e apreciadas por mim em minha caminhada, o que se junta ao pedido a seguir… 

Caso, porventura, tenham outros títulos que não estão mencionados na relação a seguir, fique à vontade de acrescentar nos comentários, e assim vamos aumentando essa lista que é cada vez mais infinita. No mínimo isso será um bom serviço prestado.

Vamos lá?

UM BOM COMEÇO…

ROMANTISMO

  • Suspiros Poéticos e Saudades – Gonçalves de Magalhães (1836).
  • A Moreninha – Joaquim Manuel de Macedo (1844).
  • Memórias de um Sargento de Milícias – Manuel Antônio de Almeida (1854).
  • Cinco Minutos – José de Alencar (1856).
  • A Viuvinha – José de Alencar (1857).
  • O guarani – José de Alencar (1857).
  • Iracema – José de Alencar (1865).

REALISMO/NATURALISMO

  • Memórias Póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis (1881).
  • Quincas Borba – Machado de Assis (1891)
  • Dom Casmurro – Machado de Assis (1899).
  • Memorial de Aires – Machado de Assis (1908).
  • O Ateneu – Raul Pompeia (1888).
  • O Cortiço – Aluísio Azevedo (1890).

PRÉ-MODERNISMO

  • Os Sertões – Euclides da Cunha (1902).
  • Triste fim de Policarpo Quaresma – Lima Barreto (1911/1915).
  • Eu – Augusto dos Anjos (1912).

MODERNISMO/PÓS-MODERNISMO

  • O Quinze – Raquel de Queiroz (1930).
  • São Bernardo – Graciliano Ramos (1934).
  • Capitães da areia – Jorge Amado (1937).
  • Vidas Secas – Graciliano Ramos (1938).
  • Morte e Vida Severina – João Cabral de Melo Neto (1955)
  • Grande Sertão: Veredas – João Guimarães Rosa (1956).
  • O Encontro Marcado – Fernando Sabino (1956).
  • Quarto de despejo: diário de uma favelada – Carolina Maria de Jesus (1960).
  • O Pirotécnico Zacarias – Murilo Rubião (1974).
  • A hora da Estrela – Clarice Lispector (1977).
  • Olhos D’Água – Conceição Evaristo (2015).
  • Ponciá Vicêncio – Conceição Evaristo (2017).

Gostou de acompanhar essa evolução histórica das letras? Que tal, então, como disse acima, mencionar nos comentários quais obras e escritores fariam parte da “sua” lista? Isso irá aumentar ainda mais as indicações e o nosso panorama literário.

E lembre-se!

COMPARTILHAR É SE IMPORTAR!

Compartilhe esse conteúdo e vamos valorizar ainda mais a nossa literatura brasileira.

Forte abraço!

UM RECADO BEM CARINHOSO

Relicário Pessoal – haicais
Número de páginas: 90
Edição: 1º (2018)
ISBN: 978-85-53047-06-2

Você já teve a oportunidade de ter um livro sustentável feito um a um, desde o corte do papel, passando pela costura à mão, colagem, prensagem em prensa de madeira até o acabamento da capa?

Ter um livro assim é, além da arte e da literatura, uma escolha e um respeito ao meio ambiente.

E como estamos em setembro, o mês da primavera, venho oferecer com muito carinho o meu livro Relicário Pessoal – haicais. Isso porque os haicais dialogam com a natureza interna e externa de todas as coisas, inclusive nossas; falam das flores, essas dádivas da criação, das estações e do florescer de um novo tempo. Tudo isso em pequenos versos como gotas de sensibilidade que nos levam a um estado de reflexão e presença.

As páginas do livro podem ser aromatizadas com essência de lavanda, menta ou canela à sua escolha, o que te proporciona uma experiência sensitiva e agradável além da leitura.

Portanto, se desejar ter essa arte com você, é só me dizer que eu terei o maior prazer de enviá-la em uma embalagem igualmente sustentável e com muito significado.

Leia, medite, esvazie-se das ilusões e faça das expectativas um brincar de árvores…

O valor do livro é de R$35,00 + R$10,00 de envio módico pelo Correio. Este preço ficará válido até o dia 30 de setembro.

UMA ROTINA SAUDÁVEL

Peço licença para compartilhar uma vivência com você.

Hoje, dia 30 de agosto, levantei às 5h. da manhã com a decisão tomada de ser este o horário para iniciar o meu dia e fazer tudo o que desejo e preciso.

Entendi que, como escritor, sou um operário e tenho com as letras o compromisso do trabalho e do servir, e escritor escreve todos os dias, (nem tão) simples assim, mas é o nosso ofício.

Assim, com tudo que tenho a realizar durante o dia, estabeleci que estarei escrevendo de 7h. às 9h., impreterivelmente, com sol ou chuva, frio ou calor, e isso é inegociável. Mesmo que o tempo seja pouco, adotarei Hemingway e deixarei para o dia seguinte o auge da vontade, embora bem aproveitado todo minuto é uma eternidade.

O levantar às 5h da manhã é que necessito me preparar e cuidar das minhas meninas – esposa e filha. Inicio o dia com minhas meditações e visualizações, preparo o café delas para que possam ir para o trabalho e escola e, assim, poder estar totalmente disponível também para o meu trabalho. A partir das 9h. lanço-me à confecção dos livros e cadernos para à noite poder estar com meus alunos no curso Vivenciando a Linguagem, Leitura e Escrita e finalizar a travessia com uma bela, prazerosa e necessária leitura.

Hoje fui organizar os textos a fazerem parte do meu próximo livro “O pé de ameixa da casa da minha avó e outras crônicas” que, por motivo de agenda, será lançado em 2023. Mas é necessário deixa-lo pronto, e é incrível! É só começar a mexer que o livro acontece dentro da gente…

Mas vamos caminhando.

E você, qual é a sua rotina saudável?

Forte abraço!
Leandro Bertoldo Silva.