
Por Leandro Bertoldo Silva – do livro Entrelinhas Contos mínimos
Sexta-feira. Os carros avançam os sinais na hora da Ave-Maria. Na verdade, as horas todas foram tensas, de uma tensão de espera. É hoje o grande dia! Multidões caminham de um lado para o outro e ninguém se olha, ninguém se percebe nas ruas, nos ônibus lotados, nos sinais fechados. Esbarrão.
— Oh, seu moço, desculpe! Eu…
— Seu filho da…
Fui percebido, afinal. Melhor não ter sido… Por que tudo isso? Para que tanta correria? Seja como for, sinto que estou a descobrir o que move e o que moveu, neste dia, a vida de tantos Joões e de tantas Marias. Chego à minha casa e não me dou conta de nada. “Em que planeta eu vivo?”. Vivem me perguntando isso… A Renata! Sempre tão bem informada… Pego o telefone.
— Alô, Renata! Como vai? Você…
— Agora?! Daria para ligar depois? Hoje é o grande dia!
— Mas é isso mesmo que eu quero saber! Dia do quê?
— Dia do quê?! Em que planeta você vive? Ligue a televisão, rápido! Não vai querer perder o último capítulo da novela, vai? Depois a gente se fala, tchau!
Tu… tu… tu…
Desligo o telefone. Absorto em meus pensamentos e num misto de tristeza e alegria por, enfim, saber a resposta, vou até o grande quadrado de sonhos e desejos e, ao invés de ligá-lo, desconecto o cabo da tomada na garantia de continuar no meu planeta…
Tchau, Renata.
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Publicado por leandrobertoldo
Sempre gostei de histórias. Os primeiros livros que li foram os clássicos “Cinderela” e o “Caso da Borboleta Atíria”, da antiga coleção vaga-lume. Hoje as coleções são mais modernas, melhoradas... Mas aqueles livros transformaram a minha vida. Lia-os de cima de um pé de ameixa, na casa de minha avó, e lá passava a maior parte do meu tempo sempre na companhia de outros livros que, com o tempo, foram ficando mais “robustos”. A partir de José Lins do Rego e seu “Menino de Engenho” fui descobrindo Graciliano Ramos, Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector, Fernando Pessoa, Henriqueta Lisboa, Fernando Sabino, Murilo Rubião... Ainda hoje continuo descobrindo escritores, muitos se tornando amigos, outros pelas páginas de seus livros, como Mia Couto, Ondjaki, Agualusa. Porém, já naquela época sabia o que queria ser. Não tinha uma formulação clara, mas sabia que queria fazer parte do mundo das histórias, dos poemas, dos romances e das crônicas, pois aquilo tudo me encantava, me tirava o chão, fazia a minha imaginação voar. Hoje sou um homem feliz; casado, eterno apaixonado e pai da Yasmin. As duas, ela e a mãe, minhas melhores histórias... Mas também sou formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, com habilitação em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, sou Membro Correspondente da Academia de Letras de Teófilo Otoni/MG, título que muito me responsabiliza e sou um homem das palavras. Mas essas palavras tiveram um começo... O meu encanto por elas fez com que eu começasse a escrever, inicialmente para mim mesmo, mas o tempo foi passando e pessoas começaram a ler o que eu produzia. Até que a revista AMAE EDUCANDO me encomendou um conto infanto-juvenil, e tal foi minha surpresa que o conto agradou! Foi publicado e correu o Brasil, como outros que vieram depois deste. Mais contos vieram e outros textos, como uma peça de teatro encenada no SESC/MG, poemas, artigos até que finalizei meu primeiro romance - Janelas da Alma - em fase de edição e encontrei uma grande paixão: os Haicais! Embora venho colecionando "histórias", como todo homem que caminha por esta vida, prefiro deixar que as palavras falem por mim, pois escrever para mim é mais do que um ofício que nos mantém no mundo. Escrever me coloca além dele... E é por isso que a minha vida, como a de um livro, vai se escrevendo – páginas ao vento, palavras ao ar.
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E é esse o mundo em que vivemos infelizmente.Ás vezes me pergunto, qual o sentindo de uma vida tão corrida?Uma busca incessante por mais e nos perdendo do melhor, da essência, da razão de tudo a nossa família, as pessoas que amamos que em meio de tanta busca acaba por ficar a segundo plano e a desculpa de sempre é que estamos a buscar melhores condições e vida e bem estar para os entes queridos e passamos horas ausentes e deixando de desfrutar de momentos bons e alegres.E aí eu me pergunto: _ Que planeta estou vivendo?????
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Valéria, é uma pergunta que constantemente nos fazemos, e é bom que seja assim para ficarmos atentos às nossas verdades. Obrigado por seu belo comentário e reflexão!
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Boa noite. Como sempre a cada pagina lida, uma viagem. Abraços
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Obrigado, Antonia, por sua presença sempre!
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