
Por Leandro Bertoldo Silva – do livro Entrelinhas Contos mínimos
Sexta-feira. Os carros avançam os sinais na hora da Ave-Maria. Na verdade, as horas todas foram tensas, de uma tensão de espera. É hoje o grande dia! Multidões caminham de um lado para o outro e ninguém se olha, ninguém se percebe nas ruas, nos ônibus lotados, nos sinais fechados. Esbarrão.
— Oh, seu moço, desculpe! Eu…
— Seu filho da…
Fui percebido, afinal. Melhor não ter sido… Por que tudo isso? Para que tanta correria? Seja como for, sinto que estou a descobrir o que move e o que moveu, neste dia, a vida de tantos Joões e de tantas Marias. Chego à minha casa e não me dou conta de nada. “Em que planeta eu vivo?”. Vivem me perguntando isso… A Renata! Sempre tão bem informada… Pego o telefone.
— Alô, Renata! Como vai? Você…
— Agora?! Daria para ligar depois? Hoje é o grande dia!
— Mas é isso mesmo que eu quero saber! Dia do quê?
— Dia do quê?! Em que planeta você vive? Ligue a televisão, rápido! Não vai querer perder o último capítulo da novela, vai? Depois a gente se fala, tchau!
Tu… tu… tu…
Desligo o telefone. Absorto em meus pensamentos e num misto de tristeza e alegria por, enfim, saber a resposta, vou até o grande quadrado de sonhos e desejos e, ao invés de ligá-lo, desconecto o cabo da tomada na garantia de continuar no meu planeta…
Tchau, Renata.
