Estava a sentir uma enorme falta de mim. A última vez que estive comigo foi pelos idos dos anos 80 quando passeava tanto entre os mundos quanto entre as árvores e flores e frutos e sonhos.
Uma vez, no aniversário de 10 anos da minha filha, disse: “Quando todos colocaram as suas máscaras, resolvi tirar a minha”. Era uma festa a fantasia e naquela ocasião eu era o Visconde. Bem, eu não sou o Visconde, mas também nunca deixei de ser. Era a pura essência da magia, a mesma magia a conduzir-me pelas histórias e pelas palavras nesta existência.
Os anos passaram e aí sim eu me fantasiei. Fui técnico, professor, “homem sério”… Disfarcei-me daquilo exigido pelo mundo: ter um emprego, um diploma, uma ocupação. Mas eu tinha ocupação! Sentia o perfume das rosas com a mesma destreza de um médico ao sentir o coração de uma pessoa. Era capaz de ouvir o bater de asas de um passarinho como o mecânico a descobrir o ruído de um motor. Fazia das pedras e das folhas animais alados como os engenheiros, os arquitetos e os operários a dar forma às construções. O meu mundo se fazia pleno de sabores deliciosamente incertos.
E quando a alegoria se esfacela? E quando o tempo rompe as fibras do papel representado? Ah! Nessas horas desmancham-se os figurinos, apagam-se as luzes, finda-se o espetáculo e a vida recomeça.
Tudo se refaz quando a alegoria se esfacela.
É hora de voltar.
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Essa pequena história é o início de um recomeço, em que o tempo se encarregará de mostrar…
A Árvore das Letras é uma escola-ateliê e editora sustentável de encadernação e papelaria ecológica. Valorizamos a produção e a confecção de livros e cadernos conceituais e artesanais. Oferecemos vivências presenciais e on-line para quem quer ingressar e aprimorar no mundo da escrita e da arte da palavra.
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Um forte abraço e até a próxima.
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Sempre gostei de histórias. Os primeiros livros que li foram os clássicos “Cinderela” e o “Caso da Borboleta Atíria”, da antiga coleção vaga-lume. Hoje as coleções são mais modernas, melhoradas... Mas aqueles livros transformaram a minha vida. Lia-os de cima de um pé de ameixa, na casa de minha avó, e lá passava a maior parte do meu tempo sempre na companhia de outros livros que, com o tempo, foram ficando mais “robustos”. A partir de José Lins do Rego e seu “Menino de Engenho” fui descobrindo Graciliano Ramos, Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector, Fernando Pessoa, Henriqueta Lisboa, Fernando Sabino, Murilo Rubião... Ainda hoje continuo descobrindo escritores, muitos se tornando amigos, outros pelas páginas de seus livros, como Mia Couto, Ondjaki, Agualusa. Porém, já naquela época sabia o que queria ser. Não tinha uma formulação clara, mas sabia que queria fazer parte do mundo das histórias, dos poemas, dos romances e das crônicas, pois aquilo tudo me encantava, me tirava o chão, fazia a minha imaginação voar. Hoje sou um homem feliz; casado, eterno apaixonado e pai da Yasmin. As duas, ela e a mãe, minhas melhores histórias... Mas também sou formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, com habilitação em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, sou Membro Correspondente da Academia de Letras de Teófilo Otoni/MG, título que muito me responsabiliza e sou um homem das palavras. Mas essas palavras tiveram um começo... O meu encanto por elas fez com que eu começasse a escrever, inicialmente para mim mesmo, mas o tempo foi passando e pessoas começaram a ler o que eu produzia. Até que a revista AMAE EDUCANDO me encomendou um conto infanto-juvenil, e tal foi minha surpresa que o conto agradou! Foi publicado e correu o Brasil, como outros que vieram depois deste. Mais contos vieram e outros textos, como uma peça de teatro encenada no SESC/MG, poemas, artigos até que finalizei meu primeiro romance - Janelas da Alma - em fase de edição e encontrei uma grande paixão: os Haicais! Embora venho colecionando "histórias", como todo homem que caminha por esta vida, prefiro deixar que as palavras falem por mim, pois escrever para mim é mais do que um ofício que nos mantém no mundo. Escrever me coloca além dele... E é por isso que a minha vida, como a de um livro, vai se escrevendo – páginas ao vento, palavras ao ar.
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4 comentários em “QUANDO A ALEGORIA SE ESFACELA”
Meu amigo , não deixe a alegria de fazer artes no plural se desfazer no seu coração
Meu amigo , não deixe a alegria de fazer artes no plural se desfazer no seu coração
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Jamais, meu amigo!!
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Que lindo, Leandro! Acho que minha alegoria se esfacelou. Estou, como disse Adélia Prado: Olho uma pedra e vejo apenas uma pedra. Grande abraço.
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O que é linda, não é minha amiga?
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