Por Carolina Bertoldo
Tinha cabelos brancos, pele enrugada, alguns dentes a menos, olhos claros e muito tristes. Ninguém sabia muita coisa a seu respeito, mal cumprimentava os vizinhos, poucas das vezes que ouviram sua voz foi para xingar algumas crianças do bairro que pisaram no gramado da sua calçada. Possuía um semblante sofrido, morava sozinho e sua única companhia era um cachorro caramelo. Nunca recebeu uma visita, nunca ficou dias fora de casa, nem mesmo nos feriados. Passava aniversários, Natais e viradas de ano, ali, sozinho. Alguns vizinhos deixavam, por vezes, pratos de doces e salgados na varanda, mas lá ficavam por dias, até que fossem jogados fora. Quando alguém batia em sua porta, ele não abria. Pelas janelas, nada se via, as cortinas eram escuras e tampavam toda a visão de maneira proposital.
Certo dia a rua se encheu de viaturas, curiosos e ambulância. Uma denúncia anônima informara que alguém havia tirado a própria vida e era na casa do vizinho solitário. De lá ele foi tirado, da mesma forma que todos os outros dias, da mesma forma de sempre, em silencio e sozinho. Seu único amigo, o caramelo, foi levado pelos policiais.
Assim que a rua se esvaziou, os garotos da vizinhança, que sempre foram interessados em saber mais sobre aquela casa que vivia toda fechada, pisaram sem dó na calçada gramada, passaram pelas fitas de segurança que haviam colocado na porta da frente e entraram na residência. Ao entrar, se assustaram, porque por trás da porta não encontraram nada cinza, escuro, triste ou sujo. Mas sim, uma casa alegre, florida, cheia de vida, livros, quadros nas paredes e toda arrumadinha. Na mesa de centro da sala, o telefone sem fio tinha na tela o registro da última chamada – 190 – e ao lado de um lindo arranjo de flor, encontraram um papel escrito à mão:
“Eu devia sorrir mais
Abraçar meus pais,
Viajar o mundo e socializar.
Nunca reclamar, só agradecer,
Fácil de falar, difícil fazer…”
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