O TEMPO

Por Tomé Nasapulo.

Aí vai a minha história de vida com o Tempo.

Chamo-me Tomé Nasapulo, conheci o Tempo assim que nasci. Na verdade, foi o tempo que conheceu-me primeiro. Evidentemente, eu nem sequer tinha noção de sua existência no começo da vida. Em franqueza vos digo: foi um amor à primeira vista! Desde então, tornamo-nos inseparáveis, partilhando cada instante das nossas vidas, sejam bons ou ruins.

Dias, meses, anos passavam até descobrir que não conseguíamos viver separados, logo, decidimos selar a cumplicidade em matrimónio. Como foi maravilhoso! Jovem, de apenas 18 anos de idade, ansioso para conquistar o mundo.

Após o matrimónio não se demorou para que tivéssemos a nossa primogénita, Paciência.

Com o ímpeto da juventude, queria dar tudo ao Tempo, sem obedecer as etapas. Entretanto, o Tempo dotado de experiência, mostrou que as coisas não funcionavam daquela maneira. Demorou perceber que o tempo tinha razão. Só tomei consciência após o nascimento da nossa filha Paciência. A Paciência mostrou-me que com o trabalho, comprometimento tudo se ajeita no momento certo.

O amor era tanto! Não esperamos mais, veio o segundo filho, a quem chamamos de Resiliência. A Resiliência nasceu no momento mais conturbado da nossa vida. Na ingenuidade, estava na eminência de separação, trocar o Tempo pelo Suicídio, mas o Tempo como sempre, mostrou-se experiente provando que não passava de uma neblina e tão logo o sol daria a sua graça e continuaríamos as nossas vidas.

Olhei para Resiliência, percebi que era o momento do recarregar das energias e lutar para enfrentar a crise.

Os anos foram passando, com eles foi se apimentando a nossa relação, daí o Tempo propor que tivéssemos mais um filho, todavia receei em anuir devido as dificuldades da vida, mas vocês sabem que quando a mulher quer tudo acontece. Por conseguinte, nasceu a nossa filha Kwasula, o qual demos o nome de Maturidade.

A Maturidade é o show-off da casa, tudo acontece a sua volta e com ela compreendemos a razão do ser das coisas.

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Essa é a linda e inspiradora história do tempo de Tomé Nasapulo, poeta e contista de Angola que nos visita aqui neste espaço. Conte aqui nos comentários o que achou e também nos diz como você lida com o “seu” tempo. Adoraríamos saber 🙂

Forte abraço!

Até a próxima.

O QUE AS EDITORAS QUEREM?! ACHO QUE ESSA PERGUNTA PODE SER FEITA DE OUTRA MANEIRA…

Se você é escritor ou escritora ou mesmo familiarizado com a escrita já deve ter ouvido essa pergunta: “o que as editoras querem”? Engraçado, nunca ninguém havia me perguntado o que eu queria das editoras… Bom deixar claro: não sou contra elas, só acredito que existem outros caminhos. E se não existirem? Nós construímos. Não tão simples assim, mas possível.

Foi esse pensamento que me fez recusar um contrato em 2016 e passar alguns anos elaborando o meu jeito de publicar, porque mais do que escrever e ter os meus livros em uma estante de livraria, eu sempre quis costurá-los, colá-los, prensá-los, e mais: mostrar às pessoas como se faz isso.

Mais do que o suposto lugar de honra do escritor inatingível, eu prefiro o lugar do encontro, da fala, do contato simples com o leitor. Essas imagens mostram isso.

Por isso, quero agradecer à professora @viviane_goncalves24 (há professores e professores… Os alunos agradecem) por sua dedicação exemplar e inspiradora, por ter escolhido o meu livro “Entrelinhas contos mínimos” para trabalhar com eles e, claro, todos os alunos e alunas da Escola Estadual Professor José Monteiro Fonseca pela visita, pelo carinho e pela partilha.

São por momentos assim que escolhi ser um escritor realmente independente e criar uma literatura que chamo de identidade própria. Quer vir fazer uma visita?

Saiba mais sobre a Alforria Literária clicando AQUI!
Forte abraço.

FUTURO INCERTO

Por António Alexandre
Angola

Olhei a minha volta e vi tudo natural

Mas tudo que vi me fez mal

Vi crianças descalças sem destino sem caminho

O tempo para elas passa e dos adultos não há nada nem carinho

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Vivo numa terra de abundância riqueza

Mas o povo conserva tristeza

O sofrimento perpétuo das crianças me atormenta

Na lixeira, nas ruas estão elas catando restos que não alimenta.

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Vejo os mais velhos comendo tudo até as sementes

De barrigas cheias nada deixam para as crianças

Vejo velhos e crianças sem alimentação

E refugiam-se ao  criador do céu e da terra como solução.

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Aqui trago mais uma vez a poesia de António Alexandre, um poeta sensível que se compadece das dores do mundo. Um dia viu quatro crianças a caminhar e a catar na lixeira algo para se alimentar. “Por que isso acontece em uma terra tão rica?” Que a poesia nos aponte uma resposta…

Forte abraço!

Até a próxima.

MATERNIDADE

Por Leandro Bertoldo Silva

Maternidade era uma das palavras esquecidas no seu dicionário. Era fácil demais para algumas pessoas pensarem nisso, não para ela, de corpo perfeito e vida em liberdade. Por isso, seu ventre crescido estava na contramão de todos e recordava sua rejeição. Daquele invólucro perfeito, ficariam cicatrizes, marcas que sobreporiam ao efemeramente físico e atingiriam sonhos interrompidos.

Dejanira era mulher do mundo. Esse era o resguardo que nunca pensou em abandonar, nem sequer substituí-lo por um momento que fosse. Sentia-se sem vida, apesar da vida que crescia dentro de si. E, agora, mesmo sendo duas, teimava em sua solidão. O tempo passava, mas não levava a angústia que aumentava a cada dia que a circunscrição de seu estado apontava. Já dividia seu alimento, mesmo sem sua permissão, como seria dividir o resto? Era o que pensava desolada e inquieta. Só havia um jeito: acabar logo com aquilo. Porém, o feto crescido já era uma criança e, antes mesmo de pensar em qualquer outra coisa, de seu corpo redondo começou a emergir um líquido que, ao rebentar da bolsa, jorrou junto com uma sensação indefinível que a urgência do momento não permitiu reflexões. Elas só vieram quando, já com a criança liberta deitada em seu peito em meio aos médicos, começou a cantarolar uma cantiga de ninar no mesmo momento em que seus seios saciavam o filho que calava a ouvir.

Seus olhos recém-maternos se iluminaram, e o coração, que antes rejeitava, agora acalentava e se punha a descobrir uma desconhecida impressão felina e protetora.

A mulher do mundo sem fronteiras não sabia se o choro convulso que irrompia naquele instante era amor ou remorso, talvez fossem os dois. Aquele momento eternizado na música que embalava sua criança fazia pensar: afinal, é a mãe quem dá à luz um filho ou é o filho que faz nascer a mãe?

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Esse texto já esteve por aqui. Mas o trago novamente nesse dia porque fala de um sentimento que é maior do que o mundo, que abraça e salva. O dedico a minha mãe e a todas as mães dessa terra.

Forte abraço!

Até a próxima.

MIUDEZAS GRANDIOSAS

Por Gabriela Lopes

Gabriela Lopes dos Santos é escritora, poeta e artista plástica mineira, de Teófilo Otoni.

Olho a fumaça

saindo da boca,

no frio da manhã.

Raios tímidos de sol

aquecem o corpo,

revigoram os pulmões.

Ao redor, o verde cintilante.

Estar vivo é um êxtase vibrante.

Sinto o cheiro do mato.

Toco orvalhos

umedecendo as mãos.

Alegro-me com o céu azul.

O sol pulsa a vida.

No rosto os raios

trouxeram certezas,

o belo está nas miudezas.

A pena de um pássaro

se solta de um galho,

lentamente cai

pousando na minha mão.

Voa pena, voa cantos.

Estar conciliado consigo,

é um carinho na alma.

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Você já percebeu a capacidade que muitos pessoas têm de enxergar a grandiosidade das miudezas? Quais são as coisas mais simples da sua vida, aquelas que não têm nenhum valor de mercado, mas que você não venderia por nada?

Forte abraço!

Até a próxima.