Por Leandro Bertoldo Silva
Imagem: arte Geane Matos Mandalas
Sempre fui otimista,
mesmo nas piores ocasiões.
– Zélia Gattai –
Apresentou-se ao marido de manhã com uma decisão tomada:
— Quero me descasar com você.
A sentença seca e inesperada fez com que Eduardo fingisse demorar-se numa risada incrédula, porém nervosa. Tal atitude era a tentativa de defender-se daqueles olhos órfãos de carinho que o miravam profunda e serenamente.
— O que está querendo dizer? — indagou ainda na retaguarda, já imaginando dissabores.
— O que você ouviu. Quero me descasar.
Num instante, lembrou-se do que vinha acontecendo, ou melhor, do que não vinha acontecendo em suas vidas, do tanto que estavam distantes – quase dois estranhos dentro de casa e fora dela – e sabia que isso, um dia, pediria enfrentamento. Mas assim, sem avisar?
Logo, o ego-semprismo compareceu à inesperada reunião trazendo o costumeiro ataque e, sem esperar ou sequer tentar mudar os óculos, lançou a pergunta:
— Existe outra pessoa?
— Sim.
O chão parecia ter sido tirado de seus pés. Seu corpo todo tremeu, seus olhos embaçaram. Sentando para disfarçar o indisfarçável, quis saber quem era. A esposa, sem contra-ataques, mantendo a serenidade no rosto e até um carinho nos olhos, disse, pausadamente, como se estivesse lendo uma missiva: que era alguém que a entendia, que era capaz de adivinhar seus pensamentos e desejos antes mesmo de os terem, que entendia que nada estava garantido e que, por isso, enxergava-a e cuidava dela como uma preciosidade que não queria perder, ocupando, assim, o seu lugar em seu coração; uma pessoa, enfim, que a fazia sentir o lado prazeroso e leve do encontro.
Parecia não acreditar no que ouvia. Os sentimentos se misturavam entre cólera e desespero. Num impulso, bateu com os punhos na cama, gritando para aliviar o que o explodia:
— O nome! Diga-me o nome!
A mulher, já com as lágrimas nos olhos que insistiam em demonstrar afeto, respondeu ao marido, deixando-se chorar:
— Eduardo.
Ao dizer o seu nome, tirou debaixo do travesseiro uma folhinha de calendário e lhe entregou. Nela, estava a data bem marcada de vermelho: 12 de junho, dia dos namorados…
Publicado por leandrobertoldo
Sempre gostei de histórias. Os primeiros livros que li foram os clássicos “Cinderela” e o “Caso da Borboleta Atíria”, da antiga coleção vaga-lume. Hoje as coleções são mais modernas, melhoradas... Mas aqueles livros transformaram a minha vida. Lia-os de cima de um pé de ameixa, na casa de minha avó, e lá passava a maior parte do meu tempo sempre na companhia de outros livros que, com o tempo, foram ficando mais “robustos”. A partir de José Lins do Rego e seu “Menino de Engenho” fui descobrindo Graciliano Ramos, Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector, Fernando Pessoa, Henriqueta Lisboa, Fernando Sabino, Murilo Rubião... Ainda hoje continuo descobrindo escritores, muitos se tornando amigos, outros pelas páginas de seus livros, como Mia Couto, Ondjaki, Agualusa. Porém, já naquela época sabia o que queria ser. Não tinha uma formulação clara, mas sabia que queria fazer parte do mundo das histórias, dos poemas, dos romances e das crônicas, pois aquilo tudo me encantava, me tirava o chão, fazia a minha imaginação voar. Hoje sou um homem feliz; casado, eterno apaixonado e pai da Yasmin. As duas, ela e a mãe, minhas melhores histórias... Mas também sou formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, com habilitação em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, sou Membro Correspondente da Academia de Letras de Teófilo Otoni/MG, título que muito me responsabiliza e sou um homem das palavras. Mas essas palavras tiveram um começo... O meu encanto por elas fez com que eu começasse a escrever, inicialmente para mim mesmo, mas o tempo foi passando e pessoas começaram a ler o que eu produzia. Até que a revista AMAE EDUCANDO me encomendou um conto infanto-juvenil, e tal foi minha surpresa que o conto agradou! Foi publicado e correu o Brasil, como outros que vieram depois deste. Mais contos vieram e outros textos, como uma peça de teatro encenada no SESC/MG, poemas, artigos até que finalizei meu primeiro romance - Janelas da Alma - em fase de edição e encontrei uma grande paixão: os Haicais! Embora venho colecionando "histórias", como todo homem que caminha por esta vida, prefiro deixar que as palavras falem por mim, pois escrever para mim é mais do que um ofício que nos mantém no mundo. Escrever me coloca além dele... E é por isso que a minha vida, como a de um livro, vai se escrevendo – páginas ao vento, palavras ao ar.
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Dia dos namorados.
É sempre prazeroso te ler e ouvir.
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Que maravilha saber disso…
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